José Saramago é um nome que causa a muitas pessoas algum grau de azia. O mesmo acontece comigo, sempre que alguém me fala de Margarida Rebelo Pinto, talvez um dia aborde aqui esse tema; uma coisa é certa, só existem duas posições possíveis no que diz respeito ao Nobel português: ou se adora, ou se detesta.
Embora eu me encontre no primeiro grupo, procurei perceber como é que alguém pode não gostar deste escritor e cheguei às seguintes conclusões:
1) A primeira, e mais óbvia, razão para detestar Saramago é não o saber ler e atirar as culpas para o facto de ele ter "uma pontuação estranha". Passamos anos na escola a ser formatados, acerca de como posicionar correctamente vírgulas, pontos finais, travessões, etc, etc. Chega este senhor aqui e escreve como lhe apetece, sem obedecer às regras de ouro, que durante tantos anos nos foram incutidas. Eu consigo compreender como é que isto enraivece muita gente. Mas penso que conseguir criar um novo estilo de escrita, que, se lermos atentamente e sem preconceitos, conseguimos perfeitamente entender, é ainda mais complicado do que inventar uma nova linguagem, como fez por exemplo J.R.R. Tolkien.
Ontem ocorreu-me que se escrever é uma arte como a pintura, Saramago é como Picasso; ele não se limita a "pintar" o que vê, ele "pinta" como entende que realmente se deve pintar e sem ser limitado por aquilo que seria a correcta forma de o fazer;
2) A escolha do escritor em mudar de país de residência, ainda para mais recaindo a escolha sobre nuestros hermanos, não agradou aos mais patrióticos. Embora não concorde com a sua posição iberista, devido ao meu próprio orgulho em ser portuguesa, e também porque penso que nunca existiria um verdadeiro país, já que a própria Espanha se encontra minada de regiões que anseiam pela independência, apoio a sua decisão. Esta foi tomada após tudo ter sido feito pelo Estado português, para impedir que a obra "O Evangelho Segundo Jesus Cristo" representa-se Portugal num concurso europeu, por alegadamente ir contra a fé católica. Ora, o Estado não é teoricamente laico?
Se o meu próprio país negasse as minhas convicções e me censurasse, não hesitaria em mudar-me, ainda para mais se metade da minha família fosse espanhola;
3) Ser um escritor que declara abertamente o seu ateísmo e que denuncia os podres da Igreja Católica (basta ver pelo ponto anterior, como isso cai mal a muito boa gente cof-cof);
4) Fazer parte do programa escolar. Não gostar de Saramago é para muitos adolescentes uma forma de serem "fixes". Mal eles sabem, que parecem simplesmente uns cordeiros que seguem o rebanho. Quem realmente marca a diferença é quem tem opiniões próprias e justificadas.
5) Ser José Saramago, o prémio Nobel português. É triste, mas penso que a inveja é, hoje em dia, o principal problema e a raiz de todos os problemas do nosso país, das nossas famílias e da nossa vida. Sendo este escritor genial, muita gente odeia-o pelo simples facto de o ser.