domingo, 7 de outubro de 2018

A Casa - José Saramago

No ano em que Saramago partiu deste mundo, visitei Lanzarote pela primeira vez. Aquela paisagem negra imponente ficou-me na memória apesar de apenas lá ter estado durante umas horas. Oito anos depois, no ano em que se celebram 20 anos da atribuição do nobel da literatura, voltei. Desta vez ia com a liberdade da vida adulta e pude visitar "A Casa". 

Fomos numa manhã cinzenta de terça-feira. Estava curiosa, mas sem qualquer tipo de expectativa. Sempre gostei de Saramago, mas não estava preparada para esta visita. Já li várias obras do escritor e ainda hoje é uma constante nas minhas leituras. No entanto, não esperava emocionar-me, como aconteceu durante esta experiência. 

A visita tem duas partes diferentes: A Casa e a Biblioteca. Somos convidados pela simpática guia a entrar no hall de entrada de um homem e de uma mulher que partilham, entre outras coisas, uma paixão pelos livros e pela arte, que são evidentes em todos os compartimentos da casa. Sente-se uma atmosfera tão intima, que chegamos a achar-nos intrusos. Aprendi algumas coisas que não sabia sobre Saramago; ouvi a história do seu avô que se despediu das árvores antes de ir uma última vez para o hospital e que despoletou uma série de emoções em mim que não pude controlar; observei o cadeirão onde o escritor se sentou a escrever e onde todos os dias o seu cachorro lhe fazia companhia...Não ouvi tudo o que a guia dizia, porque estava demasiado atrapalhada a tentar esconder as lágrimas. Foi difícil, considerando que só estava eu, o meu namorado e a guia. Escusado será dizer, que não escondi nada.



No final de tudo, fomos conduzidos à cozinha de Saramago e Pilar, onde nos ofereceram um expresso. Não gosto de café, mas estava tão constrangida por me ter emocionado que acabei por beber, com vergonha de recusar. Foi uma oportunidade para me recompor de uma viagem pelas memórias de alguém que teria vivido mais se pudesse. É triste a falta de tempo que sempre há para se viver.

Durante o resto do nosso tempo em Lanzarote a sensação de calma com que saí da visita "À Casa" nunca me abandonou. Como um tímido fantasma nostálgico que assombra o espírito, relembrou-me todos os dias de que cada momento é precioso, quer se seja um nobel da literatura, ou um simples mortal, ou os dois - um nobel da literatura e um simples mortal. 

Fiquei muito feliz por ter tido a oportunidade de visitar a casa de Saramago, ainda que saia de lá com um sentimento de perda, porque a vida não dura para sempre. Até mesmo a de um nobel.