domingo, 25 de março de 2018

"Homens sem Mulheres" - Haruki Murakami

Não sou fã de livros de contos. Penso que já falei sobre o facto de sentir que, quando leio um livro de contos, as histórias parecem-me sempre incompletas. É rara a situação em que sinto que há uma conclusão satisfatória. Por esta razão, raramente dou uma hipótese aos contos. Tenho sempre medo de me desiludir. 

Quando me ofereceram este "Homens sem Mulheres", de Murakami, não fazia ideia que se tratava de um livro de contos. Quando percebi isso, esse pequeno pormenor deixou de interessar, porque já estava imersa no mundo deste escritor maravilhoso.

Este livro reúne 7 contos, que apenas tem em comum o protagonista - um homem solitário com historial de amores passados e de desilusão. Os contos nem sempre são narrados na primeira pessoa. Há alguns que contam episódios da vida de outros homens. 

Adoro quase tudo o que Murakami escreve. É dos poucos escritores que consegue fazer-me rir e chorar numa mesma história. Relaciono-me com o que ele escreve, e acredito que toque mais pessoas da mesma forma, porque sinto que consegue passar para palavras uma série de experiências e sentimentos que caracterizam o quebrar das ilusões da idade jovem. Tem um olhar muito racional e frio, mas simultaneamente apelativo, da vida em geral. 

Também com estes contos me ri alto um par de vezes. Uma das passagens que me fez rir foi esta conversa e reflexão do narrador:

"(...) Por exemplo, quando te masturbas, imaginas uma mulher em concreto, certo?
- Bom, sim...
- Pois eu não consigo imaginar Erika quando chego a vias de facto. É como se fosse uma coisa errada. Então penso noutra rapariga. Pode até ser alguém que não me atraia. Que me dizes?
 Meditei sobre o assunto, mas não cheguei a uma conclusão. Já é difícil entender a nossa, quanto mais a masturbação dos outros..."

Esta tirada vem num contexto tão aleatório, mas a conclusão do narrador é dada de forma tão lógica e honesta, que me arrancou uma gargalhada. 

Outra passagem que também captou a minha atenção foi a seguinte:

"- Se calhar, é necessário passar por experiências dolorosas e por momentos difíceis quando somos jovens. Faz parte do processo de crescimento.
- Acreditas nisso?
- Sim. Acontece o mesmo com as árvores. Para se tornar forte e robusta, uma árvore tem forçosamente de resistir aos Invernos rigorosos. Num clima quente e temperado, os anéis de crescimento correm o risco de não se formar."

São estas coisas óbvias, mas ditas de forma bonita, que me fazem gostar tanto de Haruki Murakami. Se nunca leram nada dele, estes contos são uma boa amostra. 

quinta-feira, 22 de março de 2018

Vida de Vet numa Multinacional

Há muito que não falo de episódios do trabalho, ou de trabalho no geral.

No mundo dos veterinários, há a ideia de que quem vai fazer clínica numa multinacional, vai necessariamente fazer só vacinas e desparasitações. Não vai ser médico veterinário a sério, porque vai trabalhar num "vacinódramo"; não vai acompanhar situações complexas.

Sinceramente não sei se essa ideia é propagada por colegas mais velhos, se é uma ideia que adquirimos na universidade, em estágios, ou se era uma ideia pré-formulada e baseada em generalizações só minhas (embora duvide). 

Era por esta razão que sentia algum receio em optar por deixar a clínica onde estava, que já tinha mais de 20 anos de existência e provas dadas, e ir trabalhar num contexto diferente. 

Entretanto passaram 6 meses e ainda não estou arrependida. Tem sido uma experiência interessante e diferente. Tive a sorte de embarcar num projecto novo, o que me permitiu acompanhar o crescimento de uma clínica veterinária desde o zero, sem a parte de estar economicamente comprometida. Isso trouxe também algumas desvantagens, como é óbvio. 

Nos três primeiros meses a casuística era muito reduzida. Havia dias de autêntico tédio. Lentamente as coisas foram progredindo. É verdade que grande parte do serviço veterinário está voltado para a medicina geral e preventiva, embora já tenham aparecido alguns casos mais interessantes. Faz-me lembrar um pouco quando estagiava na Escócia. 

A clínica onde estagiei, em Pitlochry, também era de clínica geral. No Reino Unido, as clínicas trabalham com centros de referenciação. Isto é, tudo o que seja algo mais complexo, como um animal diagnosticado com cancro, que precise de uma terapia especifica, ou um animal que necessite de uma cirurgia ortopédica complexa, é referenciado para um Hospital Veterinário, ou para um Centro Especializado. Há uma maior cooperação entre colegas veterinários, de modo a garantir o bem-estar do animal. Ninguém é obrigado a saber tudo sobre tudo. Cá em Portugal já começa a ser assim, e é  também assim que funcionamos, no local onde trabalho. 

No entanto, devido à forte concorrência e ao número quase incontável de clínicas, a maior parte dos locais recusa referenciar os casos com medo de perder o cliente e o próprio cliente nem sempre está receptivo a ser referenciado, porque está habituado a fazer tudo num só local. Se a clínica não dá resposta a tudo, não é uma boa clínica. Claro que isto não é necessariamente verdade e nem sempre é bom para o animal.

Na zona do Reino Unido para onde fui os animais eram tão bem tratados, que raramente ficavam doentes. Os únicos internamentos a que assisti foram um cão com leptospirose e meia dúzia de animais com historial de trauma. A maior parte da casuística era composta por animais geriátricos,  animais com problemas crónicos, medicina preventiva e dermatologia. Cá em Portugal é comum haver internamentos por falta de vacinação, por falta de desparasitação interna, ou externa, e por ingestão de substâncias tóxicas. Tudo coisas que poderiam ser evitadas, se os donos fossem minimamente informados e cuidadosos. 

Falta muita informação e responsabilidade a muitos donos de animais em Portugal. É aí que a medicina preventiva entra. É precisamente aí que sinto que o meu trabalho é importante. Nesse aspecto posso dizer que o meu estágio na Escócia foi muito importante. Não vi casos clínicos XPTO's, mas aprendi a perceber melhor os donos e as dúvidas deles. Isso acaba por ser quase tão importante, como saber diagnosticar determinada doença. 

Resumindo, gosto do que faço. Posso não me imaginar a fazer isto a vida toda, mas para já estou feliz e sinto um maior equilíbrio entre a minha vida pessoal e profissional. Continuo a não querer abrir a minha própria clínica, ou o meu próprio hospital. Acho que já existem espaços desse género aos pontapés (pelo menos, na zona onde me encontro). Se um dia decidir ter o meu próprio negócio, terá de ser algo diferente. 

Claro que se entretanto ganhar o euromilhões, há uma série de coisas em que gostaria de investir: uma editora de livros, uma casinha de turismo rural, um café com entrada livre para animais de companhia (qualquer um, nao sou esquisita), uma clínica veterinária ambulante...mas para isso era preciso jogar no euromilhões, e para já ainda não ganhei esse hábito.






terça-feira, 20 de março de 2018

Saramago era o meu escritor favorito...

Saramago era o meu escritor favorito. Ainda gosto de ler o que ele escreve, mas últimamente já não consigo apreciar a sua escrita da mesma forma. Como não foi ele que mudou, vou assumir que fui eu. Ás vezes acontece.

No inicio do mês passado, comecei a ler "O Homem Duplicado" no velhinho Kindle, enquanto voava para e da Alemanha. Desde que aterrei não senti a mínima vontade de regressar a essa leitura. Isto já me aconteceu com "O Ano da Morte de Ricardo Reis", que também acabou por ficar a meio. 

Cada vez acho mais que Saramago cativava o meu eu adolescente; revoltado com o mundo e um nadinha menos capitalista. A escrita é fluída e directa (como não haveria de ser, quando a pontuação escasseia?), mas simultaneamente tem o tom da ironia e da revolta, para com o mundo e sobretudo para com Deus. Já não me revejo nesses sentimentos.

Não é que acredite mais em Deus, do que acreditava há meia dúzia de anos atrás. Mas sinto-me bem mais flexível e menos formatada para ver só o preto, ou o branco das situações. 

Continuo a gostar de Saramago, mas já não gosto tanto. Acho que não tem mal admitir que mudamos. No entanto, o aceitar que se muda, e que aquilo que gostamos não é imutável, não é uma ideia reconfortante, para quem não gosta de mudanças. Acho que por isso existem pessoas que continuam a dizer que adoram uma determinada coisa, por uma questão de coerência. Se ela não se mantiver fiel ao que sempre foi, o que nos garante que as outras pessoas também não irão ser instáveis como nós? Mas a verdade é que toda a gente é "instável". Só não será instável, quem viver numa redoma de vidro. 

Por isso admito, sem vergonha: já gostei mais de ler Saramago.





sábado, 10 de março de 2018

"A Primeira Investigação de Poirot" de Agatha Christie

De vez em quando é preciso ler coisas leves e que entretenham a alma. Foi com essa premissa em mente (e, confesso, influenciada pelo filme que esteve recentemente no cinema "Crime no Expresso do Oriente"), que resolvi começar desde o inicio a leitura das obras de Agatha Christie. 

A última vez que li um livro desta escritora foi há mais de 15 anos atrás. Na altura gostei provavelmente tanto como gostei desta vez. A verdade é que, para quem gosta de mistério e enredos rebuscados é fácil também gostar destes livros. No entanto, sinto que ao serem uma leitura tão leve, nunca fica grande coisa dentro desta cabecinha. Passados dias já a história está esquecida. Não sei se também funciona assim com vocês.

Relativamente ao "A Primeira Investigação de Poirot", a morte misteriosa de uma mademoiselle rica levanta suspeitas e é o mistério central deste livro.

Poirot, esse individuo belga de manias estranhas, vê-se envolvido na investigação das circunstâncias do crime, por intermédio de um amigo da família. É através do olhar desse amigo, que a história nos é narrada. Por vezes dá ideia que este senhor realmente é um bocadinho limitado e a escritora aproveita-se disso para tentar dar um tom de graçola ao discurso que o famoso inspector tem, para com o amigo. 

Se os meus amigos me falassem como Poirot fala para este amigo, levavam logo um soco na cara e a amizade acabava. O humor inglês é sempre distinto do dos restantes europeus pelo tom ligeiramente arrogante. Poirot é um belga de humor inglês,  sendo descortinada aqui a nacionalidade da escritora. 

Sem querer revelar muito acerca do enredo, a parte mais interessante do livro, esta história descreve um perfeito círculo desde o inicio, até ao fim. Quem ler, vai perceber o que quero dizer. 

Recomendo, para quem estiver á procura de algo leve e que estimule a curiosidade. 

domingo, 4 de março de 2018

Viagem a Colónia - Parte II

Depois do primeiro dia calmo em Colónia, saímos de casa em direcção ao centro. 

Esta é uma cidade onde se caminha muito bem e foi isso que optamos por fazer, esperando que a chuva não resolvesse aparecer. Apenas tenham cuidado, para não serem atropelados por nenhuma bicicleta. 

Pelo caminho, encontramos uma mesquita muçulmana colossal - a Mesquita Central de Colónia. Com a curiosidade aguçada decidimos entrar. As raparigas para o andar de cima e o único membro masculino do grupo, para baixo. Depositamos os nossos sapatos num armário e, por respeito ("em roma sê romano"), tapamos as cabeças. Foi uma experiência interessante. Achei a cerimónia bonita, principalmente a parte do canto. No entanto, é difícil para mim, nascida e criada numa sociedade onde a igualdade de género é cada vez mais incentivada, compreender e aceitar o costume de existirem áreas separadas por género, dentro de um local de oração. Não somos todos filhos de Deus? 



Depois deste momento irónico - ir á mesquita na Alemanha, o país mais tolerante de sempre - continuamos o nosso passeio em direcção ao centro. Mal chegamos começou a chover torrencialmente e essa foi a desculpa perfeita para visitar o Museu de Arte Contemporânea - Museu Ludwig.  

O preço de entrada ronda os 13 euros. Com cartão de estudante fica por 8 e pico. Vale a pena visitar, se gostarem de arte. Se vos passar completamente ao lado, podem não achar piada. Como ex-estudante de Artes, gostei de ver certas coisas, nomeadamente a secção de Arte Pop. Os meus favoritos foram o "quadro de bolachas de chocolate podres" e "a senhora esculpida de forma muito realista" (como devem imaginar, estes não eram os nomes das obras). Provocaram em mim fortes emoções - a emoção de nojo e outra de susto.  


Quando saímos do museu, cerca de 3 horas depois, estávamos esfomeados! Resolvemos ir almoçar ás 18h. Comemos num restaurante libanês muito bom - Beirut - optamos por um combinado de entradas frias, que devoramos em minutos, seguido de dois pratos de carne, para dividir por todos. 

A noite terminou em casa de uma amiga, onde comemos pizza e bebemos cerveja.

Agora que escrevo estes pequenos resumos acerca de da nossa viagem a Colónia, apercebo-me como estivemos constantemente a comer. Além de constantemente a comer, também dormimos muito. No entanto, esta é uma cidade onde não é necessário correr. 3 dias são mais do que o bastante para conhecer tudo. Nós tivemos 5 dias.