sexta-feira, 25 de agosto de 2017

Levar as crianças a sério

Ás vezes, com o ritmo acelerado da vida de veterinária, esqueço-me que gosto de falar com as pessoas e de esclarecer dúvidas. Acho realmente que é nas pequenas coisas que começamos a educar os donos (ou tutores, como agora são chamados) e a fazer a diferença.

Mas o que eu gosto realmente é quando para além dos adultos, vem ao consultório crianças entre os 5 e os 7 anos. Dispenso bem os irrequietos e mal-educados, que me mexem em tudo e não são controlados pelos progenitores, mas ainda existem crianças educadas e curiosas. 

Estes dias tive de, pela milionésima vez, desmistificar o acto de dar ossos ao cão. Enquanto interiormente o adulto provavelmente pensou que eu só queria vender ração e  que sempre deu ossos e nunca aconteceu nada do que eu disse que podia acontecer (olá pai!) -maior risco de fractura de dentes, obstrução respiratória, perfuração gástrica/intestinal; fístulas anais, etc. - a criança de certeza que ouviu e vai oferecer grande resistência em casa, quando o adulto insistir em fazer asneira. Muitas das crianças até pedem para eu explicar melhor como é que todas aquelas coisas terríveis podem acontecer ao seu amigo de quatro patas. 

É por isso que quando faço a consulta de vacinação, ou primeira consulta, quando está presente uma criança, falo directamente para os pequenos. Eles são uma arma poderosa e é desde pequeno que se começa a interiorizar o que está certo e errado. 

terça-feira, 1 de agosto de 2017

"A Sangue Frio" de Truman Capote

A minha primeira experiência com Truman Capote não foi maravilhosa. "Breakfast at Tiffany's" pareceu-me supérfluo e desprovido de grande conteúdo, ainda que tenha sido muito bem escrito. 

Depois de ler "A Sangue Frio", fico contente por não ter desistido de Capote. Este livro é genial e deixou-me com uma impressão tão forte, que mesmo quando o fecho, a história continua a acompanhar-me, como se de um fantasma se tratasse. 

Esta é uma narrativa assente em factos reais, que aborda o horrendo crime ocorrido em 1959 na calma cidade de Holcomb, Kansas. Nesta pequena cidade, a família Clutter é brutalmente assassinada, sem que existam suspeitos evidentes, ou uma razão aparente. 

Apesar do leitor já saber o desfecho da história, "A Sangue Fresco" está de tal forma tão bem construído, que o factor surpresa deixa de ser importante. Somos primeiro apresentados aos Clutter. Ficamos a par dos seus gostos, das suas manias e do seu dia-à-dia. É através das suas rotinas, que vamos conhecendo os habitante de Halcomb e os lugares que caracterizam a vila. Simultaneamente, começamos também a acompanhar a vida de dois ex-condenados - Dick e Perry. Claro que não é preciso ser nenhum génio, para se perceber que estes serão os autores do crime. 



Quando nos começamos a afeiçoar à família, Capote introduz o dia em que os seus corpos são encontrados. O choque que o leitor sente, não será comparável ao que a população daquela sossegada cidade sofreu, mas dá para ter uma ideia. Quatro seres humanos inocentes, assassinados de forma brutal. Enquanto estava à procura de imagens da família, deparei-me acidentalmente com as fotografias da cena do crime. Se já a leitura me deixou agoniada, as imagens deixaram-me enojada. Aquelas pessoas podiam ser qualquer família. 

Gostei também da forma como Capote conseguiu através de cartas, diários e entrevistas, caracterizar tão bem os assassinos. A forma como Dick e Perry se acham os maiores é revoltante. O leitor é conduzido pelas palavras do escritor ao interior do cérebro daqueles dois seres. Infelizmente percebemos que aquelas pessoas não tinham problemas mentais; Perry e Dick eram simplesmente egoístas e desprovidos de compaixão. Causaria pena, se antes disso não causasse nojo.  




Inquietante e muito bem construído, "A Sangue Frio" consegue cativar qualquer leitor e até ao momento, considero-o um dos melhores livros que já li. Se quiserem aproveitem para participarem no passatempo, onde podem ganhar um exemplar. Boa sorte!