segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

(500) Days of Summer (Com SPOILERS)

"(500) Days of Summer" é considerada uma comédia a fugir para o drama, que conta a história de Tom e Summer, um casal com muitos gostos em comum, mas com expectativas completamente diferentes em relação ao relacionamento que começam. Summer, é uma rapariga um pouco perdida, talvez desiludida com um antigo amor, que sabe que não pode oferecer nada de sério; Tom é o oposto: um rapaz sonhador, que acredita no destino, nas almas gémeas e no amor para a vida toda. 

Obviamente (spoiler alert), duas pessoas com objectivos tão diferentes, acabam por não ficar juntas. E é aí que começa o sofrimento de Tom. A certa altura na relação percebemos que este já só vivia de expectativas, que saem sempre frustradas e que aumentam a infelicidade de Summer. Tom assume o papel que realmente tem nesta história, o de vilão. Ignora propositadamente os pequenos sinais de distanciamento de Summer até que esta se decide pela ruptura. O amor é egoísta, mas será que isso era realmente amor, ou apenas uma ideia de amor?

E é por isso que este filme mexe comigo (e com muita gente). Eu sou o Tom. A minha cabeça está cheia de histórias e cenários que imagino para mim e para aqueles que me são próximos. Fico sem saber o que fazer, quando as coisas não acontecem como nos filmes e livros bonitos. Esses filmes e livros, que sempre me ofereceram a segurança de que algo sempre corre bem no final. 

O que é que eu faço? Que instruções devo seguir? Que escolhas devo fazer? Há realmente algum livro que nos valha? 

Paro no tempo. 

Perco-me no tempo e concluo que o livro somos nós e que o melhor é mesmo não criar expectativas, ou corremos o risco de ser o vilão da nossa própria história. 




domingo, 7 de outubro de 2018

A Casa - José Saramago

No ano em que Saramago partiu deste mundo, visitei Lanzarote pela primeira vez. Aquela paisagem negra imponente ficou-me na memória apesar de apenas lá ter estado durante umas horas. Oito anos depois, no ano em que se celebram 20 anos da atribuição do nobel da literatura, voltei. Desta vez ia com a liberdade da vida adulta e pude visitar "A Casa". 

Fomos numa manhã cinzenta de terça-feira. Estava curiosa, mas sem qualquer tipo de expectativa. Sempre gostei de Saramago, mas não estava preparada para esta visita. Já li várias obras do escritor e ainda hoje é uma constante nas minhas leituras. No entanto, não esperava emocionar-me, como aconteceu durante esta experiência. 

A visita tem duas partes diferentes: A Casa e a Biblioteca. Somos convidados pela simpática guia a entrar no hall de entrada de um homem e de uma mulher que partilham, entre outras coisas, uma paixão pelos livros e pela arte, que são evidentes em todos os compartimentos da casa. Sente-se uma atmosfera tão intima, que chegamos a achar-nos intrusos. Aprendi algumas coisas que não sabia sobre Saramago; ouvi a história do seu avô que se despediu das árvores antes de ir uma última vez para o hospital e que despoletou uma série de emoções em mim que não pude controlar; observei o cadeirão onde o escritor se sentou a escrever e onde todos os dias o seu cachorro lhe fazia companhia...Não ouvi tudo o que a guia dizia, porque estava demasiado atrapalhada a tentar esconder as lágrimas. Foi difícil, considerando que só estava eu, o meu namorado e a guia. Escusado será dizer, que não escondi nada.



No final de tudo, fomos conduzidos à cozinha de Saramago e Pilar, onde nos ofereceram um expresso. Não gosto de café, mas estava tão constrangida por me ter emocionado que acabei por beber, com vergonha de recusar. Foi uma oportunidade para me recompor de uma viagem pelas memórias de alguém que teria vivido mais se pudesse. É triste a falta de tempo que sempre há para se viver.

Durante o resto do nosso tempo em Lanzarote a sensação de calma com que saí da visita "À Casa" nunca me abandonou. Como um tímido fantasma nostálgico que assombra o espírito, relembrou-me todos os dias de que cada momento é precioso, quer se seja um nobel da literatura, ou um simples mortal, ou os dois - um nobel da literatura e um simples mortal. 

Fiquei muito feliz por ter tido a oportunidade de visitar a casa de Saramago, ainda que saia de lá com um sentimento de perda, porque a vida não dura para sempre. Até mesmo a de um nobel.

segunda-feira, 27 de agosto de 2018

"A Casa dos Espíritos", Isabel Allende

Sinto falta de alguém que partilhe o meu gosto pela leitura, quando acabo de ler algo como "A Casa dos Espíritos" da escritora chilena Isabel Allende. Quero gritar aos sete ventos que foi dos melhores livros que já li. Ri-me, zanguei-me e chorei e mais uma vez deixei-me encantar pela escrita sul americana. Que universo único é este?!

Por alguma razão, a maior parte dos meus amigos não lê muito. É estranho e fascinante, porque agora que penso nisso, as minhas amizades funcionam bem, porque toda a gente tem interesses diferentes. Interesses diferentes tornam a vida mais interessante, mas ao mesmo tempo pode ser um pouco solitário.

"A Casa dos Espíritos" segue a história da família Trueba, liderada por um homem pouco tolerante (e isso é dizer o mínimo), Esteban Trueba. Narra a vida deste homem colérico, da sua peculiar e sensível mulher, Clara, e dos seus filhos e netos. Se me perguntarem sobre o que é este livro, não vou conseguir dizê-lo de forma exacta: Este livro é sobre a vida. Simultaneamente fala sobre a história do Chile; o conservadorismo do governo, a ditadura, a tortura e morte de milhares de pessoas à garra desse regime. Fala também das mulheres. Apesar do domínio aparente do homem, é a nossa sensibilidade que comanda o mundo.  

Apesar de não ser o mesmo que "Cem Anos de Solidão", do extraordinário Gabriel Garcia Marquez, "A Casa dos Espíritos" tem muitos pontos em comum e a temática família e antepassados ocupa também um lugar de destaque na escrita de Isabel. Acho que é esta temática que de facto me fascina na escrita destes autores sul americanos; a insignificância e ao mesmo tempo significância de cada vida, a repetição dos acontecimentos e actos e a forma como o que fazemos já foi feito mil e uma vezes, mas para cada um de nós é único e irremediável - o ciclo sem fim (já faltava a referência a filmes da Disney!).

Gostava de ter mais palavras e maior talento para exprimir ao certo o quanto o meu coração ficou cheio depois de terminar este livro. Três semanas depois aqui estou eu, só e abandonada, sem ainda ter encontrado um bom substituto. 

PS - Aceitam-se sugestões!




domingo, 15 de julho de 2018

Yoga - A minha experiência

Há três meses atrás resolvi inscrever-me no Yoga. Andava cheia de stress e com dores de costas e tinha finalmente tempo para uma actividade extra trabalho.

Até então o meu único contacto com a modalidade (se é que se pode chamar isso ao Yoga), consistia nuns vídeos que vi no Youtube e numa aula que fiz há muitos anos atrás, que me deu imensa vontade de rir.

Por iniciativa própria, procurei um local especializado e acreditado pela Confederação Portuguesa do Yoga. Queria ter a certeza que estava a ter contacto com o verdadeiro Yoga e não com a modalidade alterada que trabalha apenas a parte física e descura a mente. 

Ainda assim, a primeira aula foi um choque. Não estava há espera de algo tão zen. Confesso que quase me parti a rir na parte em que fizemos exercícios que consistiam literalmente em fungar de forma vigorosa e em cantar palavras sem sentido, como se estivéssemos num qualquer culto de bruxaria. No entanto, com o passar do tempo, o que era motivo de riso, tornou-se normal e até útil. 

Nas aulas trabalhamos vários aspectos de nós mesmos: a parte física e de flexibilidade, o controlo sobre a respiração e o controlo sobre a nossa mente e os nossos pensamentos. Não há aula em que comece a suar de forma profusa, ou me sinta a desfalecer. Não é uma modalidade em que o objectivo seja perder peso (ou a barriga), ou em que sinta que a frequento com esse fim. Actualmente pratico Yoga, porque me ajuda a desligar um bocadinho do correrio e das tarefas mundanas. Sinto-me mais flexível, as costas não me doem tanto e ajuda-me a relativizar certas energias negativas. Mas atenção, não faz milagres por si só. O trabalho continua a ser nosso, mas cada ferramenta é preciosa.

Entretanto, resolvi experimentar praticar Yoga noutro local e com outra professora, e é sempre diferente. Por isso, se acham que não gostam de Yoga, porque já o praticaram em determinado momento e não se deixaram cativar, pode acontecer que não tenha sido com o professor/ra mais indicado/a. Pode também acontecer que o problema esteja na escola de Yoga, já que existem várias com filosofias bem díspares. Se mesmo insistindo, não gostarem, amigos á mesma! 







sexta-feira, 13 de julho de 2018

Projecto Gatil Simãozinho - Um exemplo a apoiar!

Há mais ao menos um ano e meio mudei-me para Guimarães. Vim eu e o meu namorado. Não conheciamos ninguém, mas foi fácil mudar isso. Viver nesta cidade é diferente de todos os outros locais onde vivi (e já vivi em pelo menos 3 cidades diferentes). Viver em Guimarães é como viver numa aldeia em ponto grande, onde toda a gente se conhece.

Claro que ser veterinária, também ajuda a conhecermos meio mundo, mas os vimaranenses tem um orgulho próprio que encanta alguns e consegue ao mesmo tempo repelir outros (Olá bracarenses!). No entanto, assim que se consegue ultrapassar essa carapaça de orgulho e fanatismo futebolístico, somos rapidamente bem recebidos.

Para além de um centro histórico lindíssimo, Guimarães tem também algo de único no país: um projecto de escola muito bem elaborado e estimado, que se encontra na Escola EB 2 e 3 Santos Simões - O Gatil Simãozinho.



O Gatil Simãozinho, não é uma associação, mas antes o refúgio para cerca de 50 gatos e gatas vitimas de abandono, negligência, e/ou maus-tratos. Foi criado há 9 anos, como um projecto de escola e é mantido pela Professora Luísa Veiga, que, juntamente com alguns voluntários e alunos, dá a qualidade de vida que estes animais não tiveram a sorte de encontrar noutro local. 

Lembro-me da primeira vez que fui ao Gatil Simãozinho. Fui chamada para ver as orelhas de um gatinho que detestava sair do seu local. Ao transpor o pequeno portão fiquei totalmente fascinada pelo local. Como amante de gatos, que não os pode ter (obrigada namorado por seres alérgico), entrar no gatil pela primeira vez e ser imediatamente rodeada por mais de 30 gatos curiosos, foi sem dúvida das coisas mais fascinantes que experimentei. 



Todos os dias estes animais tem de ser alimentados, os sanitários tem de ser limpos, e aqueles que tem alguma patologia tem de ser avaliados e tratados. Dá muito trabalho e trás muita despesa. Já para não falar dos tratamentos profiláticos: vacinações e desparasitações. Para tentar dar conta do recado, são inúmeras as iniciativas que a incansável Professora Luísa e os seus voluntários organizam: feirinhas semanais na escola, caminhadas solidárias, recolhas em alguns locais específicos (clínicas veterinárias, por exemplo), almoços e jantares solidários...Ainda assim é difícil dar resposta ás exigências destes animais.



A gestão do gatil torna-se ainda mais complicada com um dos maiores flagelos da sociedade portuguesa: o abandono animal. Só nesta semana foram 8 os gatinhos e gatinhas que foram abandonados ás portas do gatil: 4 numa caixa transportadora que penduraram nas grades da escola ao sol abrasador, sem água e sem comida alguma; 4 num saco de plástico preto. Estes últimos ainda mamavam e já estavam a ser comidos por larvas de mosca, quando foram encontrados. Todos acabaram por morrer.

Para estas pessoas cruéis e ignorantes é fácil atirar o problema para os outros. Acredito que dificilmente estes seres humanos possam ser salvos, ou reformatados a pensar de forma humanitária, mas talvez ainda se consiga fazer algo pela educação e pelo civismo dos filhos e netos deles. Porque enquanto a sociedade não compreender que a solução para o excesso de animais de rua e abandono, não é atirar o problema para as associações e para as outras pessoas, mas sim fazer parte da resolução desta calamidade pública, nada vai mudar. Quem se importa vai continuar a lutar até ficar sem forças e se sentir exausto, porque a bola de neve nunca vai ter fim. 

É por causa desta falta de educação, civismo e respeito pelos seres vivos, que projectos como o Gatil Simãozinho são muito importantes. A sensibilização das pessoas e, sobretudo das crianças, é aquilo que lentamente vai fazer com que a bola de neve que é a problemática do abandono animal, pare de crescer.

Deixo aqui o convite para que visitem a página de Facebook do Gatil Simãozinho, façam algum tipo de doação, ou simplesmente convidem os vossos amigos a fazer um "gosto" na página. É importante que estes projectos sobrevivam e se tornem a regra e não a excepção. 

Se souberem de mais projectos de escola semelhantes, por favor deixem a informação na secção de comentários, já que gostava imenso de conhecer!  




quarta-feira, 11 de julho de 2018

"Kafka à Beira Mar" - Haruki Murakami

"Kafka à Beira Mar" é dos livros mais estranhos com que alguma vez me cruzei; é um livro que nos consegue agarrar até ao ultimo ponto, mas que ao mesmo tempo parece que brinca connosco, deixando mais questões no ar do que aquelas a que responde.

A história é contada sob a perspectiva de duas personagens completamente distintas, cujo caminho converge para um mesmo ponto: Kafka Tamura (nome fictício), um rapaz de 15 anos, com uma maturidade estranhamente precoce, que foge de casa, em busca de algo mais do que uma mera existência e Nakata, um senhor já idoso, que em jovem sofreu um misterioso acidente que o deixou mentalmente limitado, mas com a habilidade de falar com gatos. Os capítulos vão alternando entre o percurso de uma e outra personagem e ao longo da narrativa, a linha que separa o real do irreal vai ficando cada vez mais fina, até que se rompe por completo.

Há tanta coisa a dizer sobre este livro, que se torna difícil escrever uma opinião. É difícil falar acerca daquilo que não se compreende na integra. 

Li algures numa review do Goodreads, que este não é um bom livro, para quem quer entrar no mundo literário de Murakami. Considero que seja verdade, para uma grande parte das pessoas. Apesar de adorar a forma simples como o escritor escreve, é preciso estar preparado para o surrealismo e simbolismo que estas histórias sempre trazem. No caso de Kafka à Beira Mar, o simbolismo e o mundo Murakami atingem o seu expoente máximo: as personagens solitárias, os mundos paralelos, os gatos, a música, as descrições sexuais explicitas e estranhas...está tudo presente e para quem nunca leu Murakami o choque pode ser demasiado grande.  

Se há 5 anos atrás tivesse pegado neste livro, em vez de (sei lá...), o Norwegian Wood nunca mais teria pegado num livro deste escritor. Para compreender Kafka à Beira Mar não basta ler este livro uma só vez. É preciso ler mais do que uma vez e conhecer Haruki Murakami, pessoalmente! Por isso, sim...talvez seja um livro incompreendido para o comum mortal, mas é um livro que adorei ler e que estará na minha lista de leituras a repetir. 




domingo, 1 de julho de 2018

O que ando a ler e isto era suposto ser um blog sobre livros

Olá pessoal! Tudo bem? Sim, tenho andado bastante ausente. Temo que este ano vá ser ainda pior no que se refere ao número de leituras. Mil desculpas por isso. Confesso que ando a falhar. 

Neste momento estou a ler várias coisas ao mesmo tempo, incluindo três revistas da National Geographic, um volume da saga Harry Potter, um livro do Murakami e outro do Maximo Gorki (só, porque o mundial é na Rússia). Ando a arrastar todas estas leituras, porque tenho tido dificuldades em fazer uma coisa: deixar o trabalho e o stress de lado.

Sempre fui uma pessoa bastante ansiosa, mas ultimamente tenho andado mal alinhada com a vida. Nada de que não ande já a tratar, mas faz com que a vontade de ler não apareça com frequência. 

Por outro lado, tenho andado a ver imensas séries televisivas:

The Handmaid's Tale S02;
13 Reasons Why S02;
New Girl Snão sei quantas...é a última;
A Casa de Papel S02;
Westworld S02;
Genius: Picasso

Sim. Muitas séries e poucos livros. 

Com o inicio de Julho, vem também uma semaninha de férias. Vou aproveitar para apanhar algum sol e para ler um bocado. Prometo que em breve virei aqui escrever alguma coisa de jeito, mas enquanto a inspiração não volta, deixo-vos apenas este pequeno update.



domingo, 8 de abril de 2018

Uma Pequena História do Mundo, de E.H.Gombrich

"Uma Pequena História do Mundo", do escritor austríaco E.H.Gombrich, é um dos melhores livros que já li.

Já me tinham falado deste pequeno livro, há cerca de cinco anos atrás, mas nunca o tinha encontrado em nenhuma biblioteca pública. Estes dias, ao passear pela secção de livros na FNAC, deparei-me com uma edição recente da Tinta da China e não hesitei em comprá-lo. 

Este é um livro dirigido a um público jovem, que fala, apenas em 400 e tal páginas, da história da humanidade. Parece pouca página para se falar de um tema tão complexo e vasto, mas a forma como está escrito consegue prender-nos e levar-nos directamente para o passado, sem que seja necessário fazer uso de personagens, ou enredos; a própria humanidade é a personagem central. 

Uma das coisas que noto, agora que já conclui o meu percurso académico, é a forma como as aulas de história eram centradas essencialmente na Europa Ocidental, em batalhas e datas, em reis e rainhas. Senti que existia um grande vazio acerca do que se passava na Europa de leste e na área que hoje em dia corresponde à Alemanha e à Áustria. Também não era dada muita atenção à Ásia e os meus conhecimentos, em termos históricos, dessas regiões sempre foram muito limitados e este pequeno livro, ajuda a trazer uma nova luz, para essas mesmas falhas; fala da história do mundo e não apenas da Europa Ocidental e dos grandes impérios.  

Há certos aspectos e dúvidas que sempre me assombraram, em termos de cultura geral, que são facilmente explicados neste livro. Por exemplo, porquê que a Primeira Guerra teve inicio? Como é que a morte de um monarca austríaco, podia levar a que todas as nações entrassem em conflito? A contextualização e a forma simples, como E.H.Gombrich escreve, torna fácil e até empolgante, desvendar esta e outras questões, sem que seja preciso perceber grande coisa de politica. 

Recomendo este livro a todas as pessoas curiosas e principalmente a quem nunca tenha gostado de história, quer sejam crianças, ou adultos. É um livro que vale mesmo a pena ler e dos poucos que acho que merecem um 5* no Goodreads.  


sexta-feira, 6 de abril de 2018

O controverso caso de Amelie

Amelie era a cadelinha de estimação da actriz portuguesa Maria João Bastos. Há coisa de dois anos, foi submetida a uma anestesia geral, para fazer uma limpeza dentária, tecnicamente chamada de destartarização, num hospital no sul do país. Após a alta, algo não correu bem e a cadelinha deu entrada de urgência, acabando por falecer. Esta é a versão resumida, sem especulação, sem detalhes e sem juízos de valor.

O que se seguiu poderia ter ajudado a trazer alguma conclusão acerca da causa de morte da cadelinha, mas tal não aconteceu, uma vez que a actriz, no meio da sua dor e perda, optou por vir para o Facebook "gritar" a sua revolta, para com o hospital e a médica veterinária que acompanhou a cadelinha.



Os comentários a esta publicação, foram vergonhosos, com insultos do pior à médica, ameaças de morte, críticas e mais insultos a toda a minha classe profissional. Isto resultou num processo de difamação contra a actriz, cujo veredicto foi publicado estes dias, sendo a actriz ilibada e optando, dois anos depois de iniciado o processo crime, por repetir as acusações. 

Se eu não fosse veterinária, se calhar até acharia aceitável a atitude da senhora e isto fez-me pensar que realmente não devemos levar uma rede social tão pouco a sério, em nenhuma área profissional. Devemos ter cuidado com o que optamos por publicar, e essa responsabilidade é ainda maior, quando somos uma "figura pública". 

Neste caso, ninguém, a não ser as pessoas envolvidas de forma directa, esteve lá para saber o que realmente se passou no pós-cirúrgico deste animal. Até pode ter sido erro da médica, ou se calhar até foi a dona que não vigiou o animal como devia, ou deu-lhe comida muito cedo. Não sabemos! No entanto, errar é humano, mas não é humano linxar em praça pública percursos profissionais que exigiram anos e anos de sacrifício. As responsabilidades devem ser sempre apuradas e procuradas, usando os meios adequados.

O que também me deixou desapontada foi a forma espantosa, como num momento somos os melhores profissionais do mundo e, ao mínimo deslize, como se erros de matemática a medicina veterinária se tratasse, passamos a ser os piores. Há bons e maus profissionais em todo o lado e eu não conheço o trabalho desta médica, mas sei que é humana e espero nunca ter de passar por semelhante situação. Ninguém erra porque sim. A perda de uma vida não é só traumática para os donos é, e ainda mais se acharmos que a culpa poderá ter sido nossa, para os profissionais que os tratam. 

Infelizmente a medicina veterinária não é matemática e os veterinários não são robots. É triste sentir que realmente os anos que passamos a estudar e o tempo que investimos nesta profissão, e as horas que passamos longe de quem gostamos, são cada vez menos valorizados pelos portugueses. Acredito que isto seja válido noutras profissões também. O atendimento e interacção com o público nem sempre é fácil, mas há limites. Dá mesmo vontade de pegar nas malas e ir para fora, para países onde somos tratados com respeito e carinho. 

Toda esta história se tornou num circo de acusações onde o importante ficou por esclarecer: afinal qual foi a causa de morte da Amelie? Tudo se perdeu; a cadelinha, a dignidade de todos os envolvidos e acima de tudo, a verdade.

domingo, 25 de março de 2018

"Homens sem Mulheres" - Haruki Murakami

Não sou fã de livros de contos. Penso que já falei sobre o facto de sentir que, quando leio um livro de contos, as histórias parecem-me sempre incompletas. É rara a situação em que sinto que há uma conclusão satisfatória. Por esta razão, raramente dou uma hipótese aos contos. Tenho sempre medo de me desiludir. 

Quando me ofereceram este "Homens sem Mulheres", de Murakami, não fazia ideia que se tratava de um livro de contos. Quando percebi isso, esse pequeno pormenor deixou de interessar, porque já estava imersa no mundo deste escritor maravilhoso.

Este livro reúne 7 contos, que apenas tem em comum o protagonista - um homem solitário com historial de amores passados e de desilusão. Os contos nem sempre são narrados na primeira pessoa. Há alguns que contam episódios da vida de outros homens. 

Adoro quase tudo o que Murakami escreve. É dos poucos escritores que consegue fazer-me rir e chorar numa mesma história. Relaciono-me com o que ele escreve, e acredito que toque mais pessoas da mesma forma, porque sinto que consegue passar para palavras uma série de experiências e sentimentos que caracterizam o quebrar das ilusões da idade jovem. Tem um olhar muito racional e frio, mas simultaneamente apelativo, da vida em geral. 

Também com estes contos me ri alto um par de vezes. Uma das passagens que me fez rir foi esta conversa e reflexão do narrador:

"(...) Por exemplo, quando te masturbas, imaginas uma mulher em concreto, certo?
- Bom, sim...
- Pois eu não consigo imaginar Erika quando chego a vias de facto. É como se fosse uma coisa errada. Então penso noutra rapariga. Pode até ser alguém que não me atraia. Que me dizes?
 Meditei sobre o assunto, mas não cheguei a uma conclusão. Já é difícil entender a nossa, quanto mais a masturbação dos outros..."

Esta tirada vem num contexto tão aleatório, mas a conclusão do narrador é dada de forma tão lógica e honesta, que me arrancou uma gargalhada. 

Outra passagem que também captou a minha atenção foi a seguinte:

"- Se calhar, é necessário passar por experiências dolorosas e por momentos difíceis quando somos jovens. Faz parte do processo de crescimento.
- Acreditas nisso?
- Sim. Acontece o mesmo com as árvores. Para se tornar forte e robusta, uma árvore tem forçosamente de resistir aos Invernos rigorosos. Num clima quente e temperado, os anéis de crescimento correm o risco de não se formar."

São estas coisas óbvias, mas ditas de forma bonita, que me fazem gostar tanto de Haruki Murakami. Se nunca leram nada dele, estes contos são uma boa amostra. 

quinta-feira, 22 de março de 2018

Vida de Vet numa Multinacional

Há muito que não falo de episódios do trabalho, ou de trabalho no geral.

No mundo dos veterinários, há a ideia de que quem vai fazer clínica numa multinacional, vai necessariamente fazer só vacinas e desparasitações. Não vai ser médico veterinário a sério, porque vai trabalhar num "vacinódramo"; não vai acompanhar situações complexas.

Sinceramente não sei se essa ideia é propagada por colegas mais velhos, se é uma ideia que adquirimos na universidade, em estágios, ou se era uma ideia pré-formulada e baseada em generalizações só minhas (embora duvide). 

Era por esta razão que sentia algum receio em optar por deixar a clínica onde estava, que já tinha mais de 20 anos de existência e provas dadas, e ir trabalhar num contexto diferente. 

Entretanto passaram 6 meses e ainda não estou arrependida. Tem sido uma experiência interessante e diferente. Tive a sorte de embarcar num projecto novo, o que me permitiu acompanhar o crescimento de uma clínica veterinária desde o zero, sem a parte de estar economicamente comprometida. Isso trouxe também algumas desvantagens, como é óbvio. 

Nos três primeiros meses a casuística era muito reduzida. Havia dias de autêntico tédio. Lentamente as coisas foram progredindo. É verdade que grande parte do serviço veterinário está voltado para a medicina geral e preventiva, embora já tenham aparecido alguns casos mais interessantes. Faz-me lembrar um pouco quando estagiava na Escócia. 

A clínica onde estagiei, em Pitlochry, também era de clínica geral. No Reino Unido, as clínicas trabalham com centros de referenciação. Isto é, tudo o que seja algo mais complexo, como um animal diagnosticado com cancro, que precise de uma terapia especifica, ou um animal que necessite de uma cirurgia ortopédica complexa, é referenciado para um Hospital Veterinário, ou para um Centro Especializado. Há uma maior cooperação entre colegas veterinários, de modo a garantir o bem-estar do animal. Ninguém é obrigado a saber tudo sobre tudo. Cá em Portugal já começa a ser assim, e é  também assim que funcionamos, no local onde trabalho. 

No entanto, devido à forte concorrência e ao número quase incontável de clínicas, a maior parte dos locais recusa referenciar os casos com medo de perder o cliente e o próprio cliente nem sempre está receptivo a ser referenciado, porque está habituado a fazer tudo num só local. Se a clínica não dá resposta a tudo, não é uma boa clínica. Claro que isto não é necessariamente verdade e nem sempre é bom para o animal.

Na zona do Reino Unido para onde fui os animais eram tão bem tratados, que raramente ficavam doentes. Os únicos internamentos a que assisti foram um cão com leptospirose e meia dúzia de animais com historial de trauma. A maior parte da casuística era composta por animais geriátricos,  animais com problemas crónicos, medicina preventiva e dermatologia. Cá em Portugal é comum haver internamentos por falta de vacinação, por falta de desparasitação interna, ou externa, e por ingestão de substâncias tóxicas. Tudo coisas que poderiam ser evitadas, se os donos fossem minimamente informados e cuidadosos. 

Falta muita informação e responsabilidade a muitos donos de animais em Portugal. É aí que a medicina preventiva entra. É precisamente aí que sinto que o meu trabalho é importante. Nesse aspecto posso dizer que o meu estágio na Escócia foi muito importante. Não vi casos clínicos XPTO's, mas aprendi a perceber melhor os donos e as dúvidas deles. Isso acaba por ser quase tão importante, como saber diagnosticar determinada doença. 

Resumindo, gosto do que faço. Posso não me imaginar a fazer isto a vida toda, mas para já estou feliz e sinto um maior equilíbrio entre a minha vida pessoal e profissional. Continuo a não querer abrir a minha própria clínica, ou o meu próprio hospital. Acho que já existem espaços desse género aos pontapés (pelo menos, na zona onde me encontro). Se um dia decidir ter o meu próprio negócio, terá de ser algo diferente. 

Claro que se entretanto ganhar o euromilhões, há uma série de coisas em que gostaria de investir: uma editora de livros, uma casinha de turismo rural, um café com entrada livre para animais de companhia (qualquer um, nao sou esquisita), uma clínica veterinária ambulante...mas para isso era preciso jogar no euromilhões, e para já ainda não ganhei esse hábito.






terça-feira, 20 de março de 2018

Saramago era o meu escritor favorito...

Saramago era o meu escritor favorito. Ainda gosto de ler o que ele escreve, mas últimamente já não consigo apreciar a sua escrita da mesma forma. Como não foi ele que mudou, vou assumir que fui eu. Ás vezes acontece.

No inicio do mês passado, comecei a ler "O Homem Duplicado" no velhinho Kindle, enquanto voava para e da Alemanha. Desde que aterrei não senti a mínima vontade de regressar a essa leitura. Isto já me aconteceu com "O Ano da Morte de Ricardo Reis", que também acabou por ficar a meio. 

Cada vez acho mais que Saramago cativava o meu eu adolescente; revoltado com o mundo e um nadinha menos capitalista. A escrita é fluída e directa (como não haveria de ser, quando a pontuação escasseia?), mas simultaneamente tem o tom da ironia e da revolta, para com o mundo e sobretudo para com Deus. Já não me revejo nesses sentimentos.

Não é que acredite mais em Deus, do que acreditava há meia dúzia de anos atrás. Mas sinto-me bem mais flexível e menos formatada para ver só o preto, ou o branco das situações. 

Continuo a gostar de Saramago, mas já não gosto tanto. Acho que não tem mal admitir que mudamos. No entanto, o aceitar que se muda, e que aquilo que gostamos não é imutável, não é uma ideia reconfortante, para quem não gosta de mudanças. Acho que por isso existem pessoas que continuam a dizer que adoram uma determinada coisa, por uma questão de coerência. Se ela não se mantiver fiel ao que sempre foi, o que nos garante que as outras pessoas também não irão ser instáveis como nós? Mas a verdade é que toda a gente é "instável". Só não será instável, quem viver numa redoma de vidro. 

Por isso admito, sem vergonha: já gostei mais de ler Saramago.





sábado, 10 de março de 2018

"A Primeira Investigação de Poirot" de Agatha Christie

De vez em quando é preciso ler coisas leves e que entretenham a alma. Foi com essa premissa em mente (e, confesso, influenciada pelo filme que esteve recentemente no cinema "Crime no Expresso do Oriente"), que resolvi começar desde o inicio a leitura das obras de Agatha Christie. 

A última vez que li um livro desta escritora foi há mais de 15 anos atrás. Na altura gostei provavelmente tanto como gostei desta vez. A verdade é que, para quem gosta de mistério e enredos rebuscados é fácil também gostar destes livros. No entanto, sinto que ao serem uma leitura tão leve, nunca fica grande coisa dentro desta cabecinha. Passados dias já a história está esquecida. Não sei se também funciona assim com vocês.

Relativamente ao "A Primeira Investigação de Poirot", a morte misteriosa de uma mademoiselle rica levanta suspeitas e é o mistério central deste livro.

Poirot, esse individuo belga de manias estranhas, vê-se envolvido na investigação das circunstâncias do crime, por intermédio de um amigo da família. É através do olhar desse amigo, que a história nos é narrada. Por vezes dá ideia que este senhor realmente é um bocadinho limitado e a escritora aproveita-se disso para tentar dar um tom de graçola ao discurso que o famoso inspector tem, para com o amigo. 

Se os meus amigos me falassem como Poirot fala para este amigo, levavam logo um soco na cara e a amizade acabava. O humor inglês é sempre distinto do dos restantes europeus pelo tom ligeiramente arrogante. Poirot é um belga de humor inglês,  sendo descortinada aqui a nacionalidade da escritora. 

Sem querer revelar muito acerca do enredo, a parte mais interessante do livro, esta história descreve um perfeito círculo desde o inicio, até ao fim. Quem ler, vai perceber o que quero dizer. 

Recomendo, para quem estiver á procura de algo leve e que estimule a curiosidade. 

domingo, 4 de março de 2018

Viagem a Colónia - Parte II

Depois do primeiro dia calmo em Colónia, saímos de casa em direcção ao centro. 

Esta é uma cidade onde se caminha muito bem e foi isso que optamos por fazer, esperando que a chuva não resolvesse aparecer. Apenas tenham cuidado, para não serem atropelados por nenhuma bicicleta. 

Pelo caminho, encontramos uma mesquita muçulmana colossal - a Mesquita Central de Colónia. Com a curiosidade aguçada decidimos entrar. As raparigas para o andar de cima e o único membro masculino do grupo, para baixo. Depositamos os nossos sapatos num armário e, por respeito ("em roma sê romano"), tapamos as cabeças. Foi uma experiência interessante. Achei a cerimónia bonita, principalmente a parte do canto. No entanto, é difícil para mim, nascida e criada numa sociedade onde a igualdade de género é cada vez mais incentivada, compreender e aceitar o costume de existirem áreas separadas por género, dentro de um local de oração. Não somos todos filhos de Deus? 



Depois deste momento irónico - ir á mesquita na Alemanha, o país mais tolerante de sempre - continuamos o nosso passeio em direcção ao centro. Mal chegamos começou a chover torrencialmente e essa foi a desculpa perfeita para visitar o Museu de Arte Contemporânea - Museu Ludwig.  

O preço de entrada ronda os 13 euros. Com cartão de estudante fica por 8 e pico. Vale a pena visitar, se gostarem de arte. Se vos passar completamente ao lado, podem não achar piada. Como ex-estudante de Artes, gostei de ver certas coisas, nomeadamente a secção de Arte Pop. Os meus favoritos foram o "quadro de bolachas de chocolate podres" e "a senhora esculpida de forma muito realista" (como devem imaginar, estes não eram os nomes das obras). Provocaram em mim fortes emoções - a emoção de nojo e outra de susto.  


Quando saímos do museu, cerca de 3 horas depois, estávamos esfomeados! Resolvemos ir almoçar ás 18h. Comemos num restaurante libanês muito bom - Beirut - optamos por um combinado de entradas frias, que devoramos em minutos, seguido de dois pratos de carne, para dividir por todos. 

A noite terminou em casa de uma amiga, onde comemos pizza e bebemos cerveja.

Agora que escrevo estes pequenos resumos acerca de da nossa viagem a Colónia, apercebo-me como estivemos constantemente a comer. Além de constantemente a comer, também dormimos muito. No entanto, esta é uma cidade onde não é necessário correr. 3 dias são mais do que o bastante para conhecer tudo. Nós tivemos 5 dias. 






quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Viagem a Colónia - Parte I

Este ano começou bem. Fizemos uma pausa no inicio de Fevereiro e fomos até Colónia, na Alemanha, visitar uma amiga.

Depois do terror que é para mim andar de avião, chegamos a terra e deparámos-nos com um frio de rachar. O dia estava como a cidade - cinzento. O primeiro passo foi encontrar forma de ir do aeroporto até ao centro de Colónia. 

Algo que me deixou chocada, ainda que não espantada, é a falta de consideração para com o turista: NADA ESTÁ TRADUZIDO PARA INGLÊS. Tudo bem que não há povo como o português, no que diz respeito a receber bem o estrangeiro, mas acho mesmo muito mau, quando, com uma língua que não se parece com nada, como é o caso do alemão, não há nenhumas indicações em inglês. Engulam o vosso orgulho pós-grande guerra e traduzam as coisas! Obrigada!

Mas como somos tugas, lá nos desenrascamos usando a sinalética com desenhos e o google maps, para dar com a paragem de comboio e o sentido em que devíamos seguir. O bilhete de comboio/metro é sempre de 2 euros e pico (dentro da área urbana). No caso dos comboios o bilhete tira-se fora da carruagem, mas no que diz respeito ao metro, o bilhete é tirado dentro do mesmo. Há uma modalidade que acaba por compensar para grupos de 3 ou mais pessoas que é o bilhete de grupo diário. O preço ronda os 13 euros e dá para usar sem limite de viagens no dia da compra. 

Achei este sistema de venda de bilhetes muito estranho. Nos cinco dias que lá estive só vimos os picas uma vez e não estavam a fiscalizar ninguém. Por isso, se preferirem arriscar e não tirar bilhete, podem tentar. Mas não digam que eu disse isso. A verdade é que com a falta de sinalética traduzida, todo o processo é ridículo. Desculpem a minha revolta, mas enerva-me quando os povos se acham superiores ao ponto de parecer que não querem turistas. 

A parte boa da visita a Colónia é que tínhamos uma guia portuguesa, que nos soube mostrar o que valia a pena ver. A cidade em si tem zonas muito engraçadas, principalmente para os amantes de arte e de cenas alternativas, mas é preciso saber onde ir e o que ver. Infelizmente isso só se descobre depois de algum tempo em Colónia. 

Enquanto procurávamos a morada da nossa amiga, aproveitamos e fomos visitar o cemitério. Como não podia deixar de ser em todas as viagens da Luisa! De todos os que já visitei este é sem dúvida o mais perturbador. Desde estátuas de palhacinhos, anjos gigantes, chão de vidro com vista directa para o caixão, vegetação abundante...há muita coisa neste cemitério gigante. Acreditem. Não iam querer passar a vossa noite ali.

No primeiro dia, e já a anoitecer, fomos à Catedral de Colónia - Kolner Dom, onde alegadamente se encontram os restos mortais dos três Reis Magos.

Se até aqui só disse mal de Colónia, esta é a parte em que falo bem. De todas as catedrais a que já fui (e já foram algumas), esta está no top 3 das minhas preferidas. Quando a vemos pela primeira vez o impacto é grande. Não só porque o detalhe da construção é enorme, mas também porque está num local tão urbanizado e moderno, que é mesmo espantoso ver algo tão antigo ali no meio. Durante a Segunda Grande Guerra (é impossível não falar DA Guerra, quando se visita a Alemanha), a catedral foi dos poucos edifícios que ficou intacto. Isto não aconteceu por respeito dos Aliados, mas porque lhes servia de ponto de referência. É incrível ver as imagens de toda a cidade destruída e leva-nos a pensar que os aliados não eram nenhuns santos e que efectivamente aquela foi uma época negra para e de TODA a humanidade. 

Esta foi também a primeira vez que visitei uma catedral de noite e é um bocadinho assustador. Nos dias seguintes voltamos lá durante o dia para ver os vitrais e admirar aquilo que de melhor tem a arquitectura gótica - o jogo entre a luz e a sombra.

Depois desta visita nocturna, seguimos para a Igreja de São Gertrudes. Fomos ver uma performance artística, de um amigo da nossa guia. A Igreja tem uma arquitectura interior diferente. Com base na estrutura da área o artista experimentava diferentes sons, que  convidavam quem assistisse a deambular pela área, experimentando os diferentes sons, de acordo com o local onde os escutava. Quem me conhece (mesmo bem), sabe que eu gosto de algo que se chama ASMR, onde os sons são usados para provocar sensações de relaxamento, por isso posso comparar a experiência com algo desse género, mas numa escala muito maior e ás vezes pouco agradável.

No final fomos jantar a um sitio terrível, que NÃO RECOMENDO, chamado Avila Tapas Bar. Nenhuma pessoa do grupo tinha experimentado este restaurante anteriormente, mas fomos porque um dos elementos era venezuelano e viu Arepas (uma sandes tipica da venezuela) no menu. Pagamos os olhos da cara por uma mini arepa, pela qual esperamos meia hora, estando o restaurante vazio, e qual factura qual quê? Tudo contas em papel...

Depois desta primeira experiência gastronómica memorável, fomos apenas a locais onde a nossa guia já tinha ido antes.  

Terminamos a noite num pub muito engraçado, com ar de ex-bar de strip e com umas luzes vermelhas todas catitas. Bebemos a única cerveja que alguma vez tolerei - a Kolsch, típica de Colónia. Depois seguimos para casa, onde comemos ovos mexidos com pão e matamos a fome deixada pelas malfadadas pseudo-arepas.








sábado, 24 de fevereiro de 2018

"Sonho Febril" de George R.R. Martin

"Sonho Febril" de George R.R. Martin foi publicado, pela primeira vez, no ano de 1982. Nessa altura ainda eu não era nascida, e ainda muito tempo faltava para a publicação do primeiro volume das Crónicas do Gelo e do Fogo (aka Guerra dos Tronos), que lançou Martin para a lista de escritores famosos.

Este livro, tal como a maior parte dos que tenho, foi-me oferecido a meu pedido já há alguns anos atrás. Achei que seria interessante ler algo de Martin fora do contexto a que estava habituada. Não fazia era ideia que este livro, aparentemente sobre barcos a vapor no inicio do século XX, incluiria vampiros. 

Se tivesse lido alguma coisa sobre ele antes de o pedir, o mais certo era ter optado por outro livro de George R.R. Martin. O tempo em que o tópico vampiro me chamava a atenção já lá vai há muito e o mais certo era não ter optado pelo "Sonho Febril".

Ainda assim, apesar desta pequena e não muito positiva introdução, o livro não é mau. Não considero uma obra-prima, nem tão pouco um dos meus livros favoritos, mas tem uma onda muito "Anne Rice" á volta dele: a luta interior dos vampiros entre o bem e o mal; a luta entre espécies; a vida e a morte, bahblahblah (ou "etc", se preferirem).

A história é narrada na terceira pessoa e centra-se em duas personagens principais: Abner Marsh, um ambicioso, mas azarado, dono de uma pequena frota de barcos a vapor, como um apetite voraz e um aspecto horrendo; Joshua York, um belo e rico senhor, com hábitos e amigos estranhos. 

Joshua encontra-se com Abner e estabelece uma sociedade. Graças a esta sociedade ambos constroem o barco a vapor mais magnifico e esplendoroso de sempre, com o qual Abner Marsh ambiciona conquistar o rio Mississipi - o Fevre Dream (Sonho Febril).

Claro que, sendo um livro de George R.R. Martin, a coisa não acontece bem assim e aparece Damon Julian o vilão louco da história e uma série de personagens morre. 

Gostei da escrita de Martin. Sempre foi um dos seus pontos fortes. Gosto da forma como ele não se perde em pormenores desinteressantes e como leva o leitor precisamente para onde ele quer, sem nos distrair. No entanto, admito que talvez aqui não tenha funcionado tão bem. Isto porque não houve algo que me surpreendesse verdadeiramente e todo o enredo era bastante previsível. Ainda assim, gostei de como havia tempo para percebermos como era a vida num barco a vapor, sem se tornar cansativo (como acontece, por exemplo, no raio do livro Moby Dick de Herman Melville). 

(Sim, acabei de dizer que George R.R. Martin é melhor que Herman Melville XD).

Foi interessante ler algo de Martin diferente da Guerra dos Tronos e, apesar de não ter amado, deixou-me curiosa e pronta para descobrir outros universos deste escritor. 




domingo, 21 de janeiro de 2018

"All The Light We Cannot See" de Anthony Doerr

"All The Light We Cannot See" (em português "Toda a luz que não podemos ver"), de Anthony Doerr surpreendeu-me pela positiva. Mais uma vez, fui buscar a sugestão ao Man Repeller... Elas são boas a sugerir livros (deixo a dica).

A época da Segunda Grande Guerra dá pano para mangas, no que respeita a questões relacionadas com a natureza humana, sob todos os primas - ódio, amor, fraqueza, força, bondade... 

Este livro tem como personagens principais dois adolescentes:

Marie-Laure é uma rapariga de nacionalidade francesa, filha de pai solteiro, funcionário de um museu em Paris. Esta rapariga fica cega na infância, mas tem uma é feliz e muito amada pelos que a rodeiam; Werner é um jovem orfão de nacionalidade alemã, que toda a sua vida cresceu com a irmã Jutta no orfanato, esperando o momento de, tal como o seu pai, ter de ir trabalhar nas minas de carvão. 

Enquanto cresce, Werner e Jutta ouvem, ás escondidas, transmissões radiofónicas francesas sobre vários temas científicos, direccionados para crianças. É nessa altura que o interesse pela engenharia e ciência desperta em Werner. Este passa a ter uma grande admiração não só pelos grandes cientistas da época, mas também pelo estranho homem francês, que se dá ao trabalho de transmitir de tão longe aquelas sessões radiofónicas que se tornam num marco da sua infância.

Com a chegada da Segunda Grande Guerra, Werner, destaca-se dos restantes pelo incrível talento para a engenharia e é levado para uma escola nazi. Aquilo que inicialmente lhe parece uma oportunidade de ouro, rapidamente se transforma em algo sobre o qual o rapaz não tem poder de decisão. E assim, a partir daquele momento, todas as escolhas de Werner são feitas por ele, levando-o a compactuar com situações com as quais a sua natureza nunca compactuaria, tivesse o contexto sido diferente. 

Werner vê o seu melhor amigo ser espancado e nada diz; vê um homem moribundo ser morto e nada faz; vê uma criança inocente ser assassinada e fica em choque...até ao dia em que decide ignorar as ordens superiores o que o leva, mais tarde, a cruzar-se com Marie-Laure. 

Por sua vez, a infância de Marie-Laure é interrompida pela guerra. Juntamente com o pai, vê-se obrigada a fugir de Paris, indo para casa de um tio-avô meio lunático, em Saint-Malo á beira mar. Esta fuga não é inocente. O pai da rapariga, é incumbido de uma importante missão: transportar um valioso diamante guardado no museu e mantendo-o seguro até ao fim da guerra. O homem aceita a tarefa, mas como ele mais três indivíduos participam. Todos transportam um diamante, mas nenhum deles sabe quem tem o verdadeiro exemplar. Este diamante além de super valioso possui uma lenda associada: o portador nunca morre, mas todos aqueles que ele ama acabam por sofrer grandes tristezas. 

A distância entre as personagens é muita, mas desde cedo sabemos que há algo que as liga: o cientista francês da rádio, que Werner tanto admirava é o avó de Marie-Laure.



O livro vai-nos contando a vida das personagens através de pequenos capítulos alternados, sempre narrados na terceira pessoa. 

Como podem ver, a história é longa e com várias nuances, mas desde cedo se percebe que estas duas crianças estão ligadas por mais do que um rádio e que eventualmente acabarão por se encontrar. 

Apesar de entender que a parte inicial do livro tem de ser longa, caso contrário não seria possível haver uma ideia tão concreta acerca do carácter das personagens e sobre o seu passado, não sinto que tenha funcionado muito bem. Esta coisa de alternar os capítulos entre personagens acaba por se tornar cansativa e acaba sobretudo por destruir o interesse em continuar a ler. Quando a história estava a tornar-se interessante para aquela determinada personagem, o capítulo acabava. Acho que foi por isso que demorei tanto tempo a terminar.

Nos capítulos finais, sente-se que há uma mudança de ritmo e tudo começa a acontecer mais depressa. Todos os pontos se ligam e temos um belo resultado. Só aí olhamos para trás e conseguimos apreciar a obra completa. Acredito é que tenha havido quem tenha ficado a meio da leitura... 

Outra coisa que também gostei foi o facto de não existir aquela distinção típica entre "bons" e "maus". Porque sejamos honestos, de certeza que em ambos os lados existiam pessoas boas e pessoas más. Pessoas que se viram encurraladas num contexto de desumanização; num contexto muito difícil de imaginar e sobretudo de julgar.

Gostei bastante da forma como terminou. Não foi um fim trágico, ou um fim cor-de-rosa. Foi um final realista e com significado.