Eu e os cemitérios temos uma
relação especial. Gosto de os visitar, não porque pertenço a um culto satânico
ou gosto de sentir as apófises ósseas debaixo dos pés, mas sim porque sinto uma
curiosidade quase macabra sobre as histórias que ele encerra. Quem eram aquelas
pessoas; quem as amava; será que alguém ainda as visita; o que gostavam de
fazer; será que preferiam duas ou só uma colher de açúcar no café; será que
bebiam café; dou comigo a pensar nisto, enquanto caminho pelos corredores
estreitos.
Já tive a sorte de poder ver
vários tipos de cemitérios: o de Barcelona assemelha-se a um muro gigantesco de
galerias escavadas, onde estão depositados os restos de centenas de pessoas; o de
Rabat, em Marrocos, é uma salgalhada de jazidos, cada um com o seu símbolo,
organizados de uma forma completamente desorganizada; em Portugal parece haver
uma competição por quem tem o jazido mais vistoso. Já me ocorreu que o aspecto
de cada um destes cemitérios reflectia a essência de cada povo, pois o modo
como cada um lida com a morte, reflecte-se na forma como vivem a vida. Enquanto
a vida dos marroquinos me pareceu inserida num caos organizado, a nossa vida,
em Portugal, baseia-se muito no aspecto e não tanto na simplicidade que notei
no cemitério de Barcelona, ainda que um pouco artística.
Hoje, quando passeava a I., resolvi
entrar no cemitério da minha cidade universitária, Vila Real. À primeira vista
é um típico cemitério português. Os típicos mausoléus espampanantes, os
mármores dos jazigos com as típicas inscrições, e as fotografias gastas estavam
lá. Notei que havia um, cujo individuo que o habitava, tinha nascido em 1816. Lembro-me
de ter pensado: “Uau! Mas há quanto tempo existe este sítio?”
Contornei uma Igreja de São Dinis
(no interior do cemitério) e fui dar de caras com um cemitério muito pouco “português”.
Era um relvado salpicado com escassas lápides, algumas delas tão antigas, que
era impossível decifrar o que lá havia sido inscrito. Para além das visões, típica
de filme americano, havia pássaros e borboletas por todo o lugar. Como é quem
em quatro anos nunca me tinha apercebido de tão bom local para ler e estudar
sossegada?!
Apesar da morbidez do local, não
pude deixar de pensar, como a beleza pode ser encontrada mesmo em locais com
significados tão tristes.
1 comentário:
Eu sinto o mesmo, mas não aprecio a maioria dos cemitérios portugueses em que se quer parecer mais rico que o vizinho...Preferia cemitérios tipo campa rasa como se vê em alguns países...Gostava de ir ao de Montmartre em Paris.
cumps
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